Como cheguei em Dublin

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(ou a pior manhã da minha vida)

Olha... É nas dificuldades que a gente cresce, né? Porque ontem foi um daqueles testes que a gente tem que tirar forças de onde não tem pra enfrentar.

Acordei às 5:00, tomei banho rapidinho e fechei as malas. Tinha fechado um serviço de transfer pro aeroporto por 15 liras. Eram horários fixos e o melhor pra mim era o das 5:30. Os caras do hostel me garantiram que 6:00 no máximo eu estaria no aeroporto. Achei ok, já que meu vôo era às 7:30.

Mas sabe aquele negócio de intuição? Alguma coisa me dizia que aquele horário era perigoso, que seria melhor pegar o das 2:30 e ficar esperando no aeroporto mesmo.

Desci com as malas às 5:30 (lembrando que eu estava no 5º andar com duas malas grandes e mochila nas costas), e fiquei esperando lá em baixo. Fiquei com a maior dor nos braços por ter carregado as malas na mão.

Espera, espera, e nada do carro chegar. O recepcionista pegou o telefone, falou algo em turco e me garantiu que em 3 minutos o carro chegaria.

O fato é que ele chegou às uns 20 minutos atrasado.

Ok, de manhã não tem trânsito, às 6:15 eu cheguei. Foi quando descobri que a rodinha da mala preta quebrou (e a alça da vermelha já tava quebrada). Não vi carrinhos disponíveis e saí arrastando as malas pelo aeroporto, morrendo de calor. Cheguei no balcão da Turkish e apesar da fila no check in, foi relativamente rápido.

A moça pegou meu passaporte e ficou muuuuito tempo olhando, digitando. Pediu meu e-ticket. Olhou, olhou e disse, num inglês bem ruinzinho, que minha passagem tava "fechada". Não entendi nada e ela me mandou ir no balcão de trás para "pegar" a passagem.

Fui arrastando mala, blusa e cachecol para o balcão. Não tinha ninguém na fila então fui direto falar com a atendente. Comecei a falar "bom dia", ela interrompeu e disse pra eu pegar a senha.

Deixei as malas, andei até a entrada, peguei a senha e voltei. Parecia coisa de filme, quando não tem ninguém e a pessoa de má vontade manda você buscar a senha pra ser atendido.

Expliquei a situação, ela procura o e-ticket e fala que perdi o vôo.

Tipo assim... A gente sabe como é ruim ouvir uma frase dessas, mas no meu caso, pareceu que o chão abriu e eu caí num buraco fundo. Não agüentei ouvir aquilo e desabei. Comecei a chorar e chorei tanto que perdi o ar.

Não era um vôo qualquer. Era o vôo que eu tinha batalhado muito pra conseguir pagar, era um sonho que estava sendo destruído. Mas o pior não foi perder o vôo. Foi quando, na maior frieza, ela me diz que a Turkish só tinha vôo pra Dublin amanhã à tarde.

...

Só de lembrar, dá vontade de chorar.

Entre muitos soluços, expliquei que não podia ir no dia seguinte, que essa história de passagem fechada não tinha sido minha culpa e tal. Ela foi totalmente inflexível e ainda me disse que eu teria que pagar uma taxa de 300 dólares pra embarcar na outra data. Continuei chorando, incrédula. Aí ela viu que não poderia fazer mais nada e me mandou falar com o supervisor.

Nisso, achei um carrinho perdido no corredor. Tropeçando nas malas, consegui colocá-las nele e tirar o cachecol e a blusa que estavam me sufocando. Cheguei na supervisora, que também bem fria me explicou que o máximo que poderiam fazer era não cobrar a taxa pra eu embarcar no dia seguinte.

Peguei o carrinho aos prantos e vi um outro balcão da Turkish que também tinha nomes de outras companhias no balcão. Cheguei e a atendente, ao contrário das outras, me deu a mão e pediu pra eu me acalmar. Me ofereceu água e comecei a explicar a situação. Ela começou a procurar vôos por outras companhias. Tinha UMA VAGA no vôo da British Airways às 13:00. Valor? 500 euros.

Tipo, nem cogitei não pagar isso. Não foi pra emergências que juntei dinheiro a mais? Saquei meu VTM e comprei a passagem. Istambul - Londres e Londres - Dublin, chegando no destino final às 18:30. Comecei a chorar de novo (uma mistura de desespero com alívio), e ela me deu a mão, disse pra eu me acalmar e que daria tudo certo. Nem perguntei o nome dela, mas daqui agradeço a atenção e boa vontade.

Agora eu precisava achar uma conexão wi-fi pra avisar minha mãe, minha amiga que me encontraria em Dublin e o serviço de transfer que contratei.

Andei pelo aeroporto inteiro até achar um café. Comprei um suco de laranja e usei o wi-fi. E aí lembrei que esqueci o carregador do celular NA TOMADA DO QUARTO NO HOSTEL. Genial.

Pessoas avisadas, procurei um lugar pra sentar NA FRENTE do balcão da British, pra não correr risco nenhum de perder o vôo. Coloquei o relógio pra despertar e dormi 1h15. Me direcionei ao check-in e...

"You need a visa for Dublin?"

Tipo... Ela falou essa frase num tom de pergunta, mas acho que ela tava querendo afirmar. Falei que ia estudar em Dublin, que tinha carta da escola... Mostra carta da escola, tudo certo. Mas claro que não eram permitidas duas bagagens para esse vôo. Tive que pagar pela segunda: mais 40 euros na conta.

Passei pelo controle de passaporte e raio-x (pela milésima vez: tira celular do bolso, tira mochila, tira notebook de dentro da mochila, tira bolsa da câmera, tira casaco...) e finalmente vi a placa do meu portão! Estava duas horas adiantada, só pra garantir.

Só que o portão tava totalmente vazio. Achei estranho, mas esperei alguns minutos. Um funcionário veio me dizer que o vôo pra Londres havia mudado para outro portão! Afff. Dá-lhe Bárbara andando pelo aeroporto totalmente esgotada, física e emocionalmente. A mochila tava bem pesada, a blusa que eu carregava tava pesada, tudo tava pesado. Mas eu não podia desistir. Ainda tinha imigração de Londres e de Dublin pra encarar. Mas tudo daria certo.

Peguei o avião pra Londres. Foi uma mistura de alívio e medo, porque 1) finalmente eu tava seguindo pro meu destino e 2) todo mundo sempre fala com medo da imigração inglesa.

O vôo foi suave. O almoço foi bom (ou era eu que estava sem comer desde as 5:00), serviram frango, batata, bolo de chocolate e várias bebidas, além de salada e pão. Os comissários são muito simpáticos e confesso que deu um conforto no coração em ouvir o sotaque britânico deles!

Antes do avião pousar, eles mostram um vídeo de preparação pra desembarcar em Heathrow. Tipo, eu já tinha ouvido falar que esse aeroporto era enorme, mas nem nos maiores exageros eu ia imaginar que ele era desse tamanho. São MUITOS terminais, MUITOS portões, lojas, um milhão de coisas. Assustei. Perguntei pra funcionária: eu deveria ir pro terminal 1. Fiquei com medo de não dar tempo, mas ela disse que daria. Peguei o ônibus e ele demorou 10 minutos pra chegar no terminal 1. O engraçado foi o meu espanto ao ver o motorista dirigindo na contramão - não contive um sorrisinho quando lembrei que estava no Reino Unido.

Cheguei no terminal 1 e logo passei pela imigração. Expliquei que ia pra Dublin estudar, mostrei a carta da escola e a mulher fez muitas, muitas perguntas. Perguntou o porquê deu ter escolhido a Irlanda, o quê eu fazia no Brasil, etc. Tentei usar um inglês bem simplesinho, pra não ficar estranho, tipo: se você já fala inglês por que quer vir? No entanto, mesmo assim ela me elogiou e disse: "you speak very good English, soon enough you'll be teaching". Hahaha. Apesar do medo, eu tava confiante pois tinha toda a documentação e, apesar das muitas muitas perguntas, ela foi simpática. Quando eu disse que uma das raõoes deu ter escolhido Dublin era o clima, ela riu e disse: "oh yeah, the rain!"

Eu tremia, o coração batia tão rápido que eu tive a impressão de que ela conseguia o ouvir. Enfim carimbou meu passaporte para um mês e pediu que eu mostrasse essa papelada toda na Irlanda de novo.

Mais uma fila: raio-x da bagagem. Eles estavam abrindo mala de todo mundo e tirando um monte de coisa. Fiquei calma, passei a mochila, tirei notebook da mochila, mas quando passei no raio-x... Apito. Mandaram tirar o sapato e ir pra uma cabine. Alguns segundos depois a cabide detectou que eu carregava algo na cintura - minha dollar bag. A moça pediu pra olhar, viu que era só dinheiro e me liberou.

Fui verificar no painel onde era o vôo: portão 8. E mais uma vez, dá-lhe Bárbara andando louca pelo aeroporto, carregando coisas e morrendo de calor. O aeroporto é gigante, cara. Enfim, depois de muito andar: portão 8.

Esse vôo durou 55 minutos. Confesso que tinha planejado "entrar" na Irlanda ouvindo "Beautiful day" do u2, mas devido às circunstâncias, preferi observar o pouso em silêncio.

Desembarcando em Dublin já achei estranho o pouco movimento nos corredores. Segui as placas e fui parar na imigração. Meio tensa, mas corajosa (afinal sobrevivi à imigração de Londres!), entreguei o passaporte e falei que tinha vindo estudar. Mostrei a carta da escola, ele anotou algumas informações, perguntou quando tempo eu ficaria e só. Nada de comprovar seguro, renda, passagem de volta. Carimbou meu passaporte com 2 meses de visto e me explicou que deveria ir até o escritório da imigração para ter o visto permanente. Depois de tudo, ainda sorriu e disse "obrigado", em português mesmo.

Fui para a esteira das malas, sem muitas esperanças. É que como o dia tinha sido bem tenso, eu não duvidaria que as malas não chegassem. Mas chegaram, e foram umas das primeiras! Obrigada, British!

Resolvi pegar o táxi porque eu não tinha nenhuma condição de pegar ônibus (que inclusive pára na frente do hostel onde estou). Entrei no carro e vim conversando com o irlandês, tentando dedicar 100% da minha atenção ao que ele falava, porque eu sabia que o sotaque era forte, mas conversar pessoalmente é sempre bem mais tenso. Ele me disse que Dublin é segura, legal, que os jovens gostam de sair pra beber e que "I'd be fine here". Conversamos de futebol (claro), trânsito e etc. A corrida deu 30 euros e ele me deixou na porta do hostel. Só que a entrada que ele me deixou é a do bar, não a do hostel em si, que fica dali a alguns metros. Cara... Nunca foi tão horrível andar tão curta distância! Eu estava levando uma mala na mão, outra nas rodinhas, mochila nas costas, blusa e cachecol pendurados. Tinha umas 20 pessoas na porta fumando e lá dentro também e NINGUÉM se ofereceu pra me ajudar. Foi um dos momentos mais losers da minha vida.

Fiquei num quarto no 3º andar, mas pelo menos aqui tem elevador! Só o wifi que é bem ruinzinho, mas pelo
menos consegui avisar a família e amigos que estava viva.

E essa foi a minha saga até Dublin.
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