Quase sertão

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A família da minha mãe é do interior de Pernambuco. Cidade pequena que até pouco não tinha todas as ruas asfaltadas, água encanada e tal.  De Recife, são quase 3 horas de viagem.

Fui pra lá ainda bebê, depois com 5, 10, 13, 19, 24 e agora, com 25 anos de idade. Me lembro de todas as vezes: as 3 primeiras de ônibus (pois é, mais de 60h de viagem), depois, avião.

Meus avós moram num sítio que fica a uns 4 km da cidade. Minha vó cuida de galinhas e vende os ovos, meu vô corta palma pra dar de comer ao pouco gado que ele cria. Com o leite, minha vó faz queijo pra vender também.

No sítio tem água encanada do açude. Tem energia elétrica, televisão e até a internet do meu celular pega rapidinho de vez em quando.

A seca por aqui nunca tinha castigado tanto como agora - quer dizer, antigamente, castigava e muito, quando minha mãe e os irmãos iam buscar água em açudes bem longe, trazendo lata na cabeça. Nos últimos 20, 30 anos, isso não aconteceu mais, principalmente depois do meu vô ter mandado construir um açude. Só que faz mais de 1 ano que não chove por lá. Nunca vi aquele açude, outrora tão cheio d'água, vazio e seco daquele jeito. É triste, mas não desesperador,  que minha família hoje tem condições de pagar um caminhão pra encher a caixa d'água, ou mandar trazer água em galões e tal.



Embora seja interior do país, no sítio não faz calor. Quer dizer, ficar debaixo do sol é tenso, mas venta muito, venta forte, a casa é super ventilada (não é a toa que fiquei cheia de fiapinhos, pequenos espinhos das palmas que devem entrar em casa com o vento forte). À noite a temperatura cai e juro, dá até pra passar frio, tipo coisa de deserto. Mas isso no sítio, porque na cidade é quente, mas quente de morrer.

Uma das coisas que mais gosto aqui é a comida: sabe aquele tempero de vó?! Aqui, a minha mata as galinhas e faz "na hora" (sorry Lê, minha amiga vegetariana). Além disso, tem feijão com farinha, cocada, doce de mamão, mata-fome, etc.

Além da comida, o contato com a família é sensacional. E é sensacional mesmo, porque tenho certeza que se convivesse com eles, não teria um relacionamento tão bom. Família grande é confusão, gente dando pitaco na sua vida, fofoca e tudo mais. Vindo passar as férias, a gente mata a saudade e não dá tempo de ter nada de ruim.

No nordeste, tenho 18 primos (contei hoje!). Não vejo todos quando vou pra lá pois é muuuita gente e não da pra colocar todo mundo junto no mesmo lugar. Sou a segunda mais velha, ou seja, a grande maioria é bem mais nova do que eu - todas as vezes em que fui pra lá convivi com a criançada e conheci primos novos. Dessa vez, foi a neta mais nova dos meus avós, uma fofinha de 1 ano e 3 meses.

Eu fiquei apaixonada pela priminha.

E eu geralmente detesto criança.

Aí fiquei pensando: o ambiente em que estamos inseridos fatalmente nos define.  E se ao invés da minha mãe ter vindo pra SP, meu pai tivesse ido pra PE? Como eu teria crescido/desenvolvido? Seria professora de inglês? Provavelmente não  Seria mais "tolerante" com crianças? Provavelmente sim. Teria um relacionamento de irmã com minha única prima de SP? Provavelmente não.

Gosto de passar férias no nordeste, ouvir as histórias e provérbios da minha vó, comer coisas gostosas e ser bem recebida pelos primos, primas, tios e tias. Mas apesar de não estar no meu melhor momento com São Paulo, sou feliz de ter nascido e me criado aqui. Foi SP que me fez ser quem sou hoje, foi aqui que tive oportunidades de estudo e trabalho, que conheci alguns dos meus melhores amigos, que aprendi, chorei, me estressei, me fiz.

Mas isso não é declaração de amor a SP, tá? Foi  uma divagação sobre uma parte da minha vida, uma parte que mora lá em Cachoeirinha, quase no sertão.
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