Alunos brasileiros vs alunos europeus

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Já quero começar dizendo que esse post é totalmente pessoal, baseado nas minhas experiências como professora e que posso estar falando muita besteira - não tome nada do que falarei aqui como verdade absoluta, afinal de contas, estaremos falando de pessoas e pessoas são sempre diferentes e causam impressões diferentes, né?

Eu dou aula de inglês desde os 17 anos e até os 27 só havia dado aula pra brasileiros. Foram diversas escolas (pequenas, de bairro; grandes franquias; alunos particulares) e alunos de várias faixas-etárias, sexo e regiões diferentes de São Paulo.

Aqui em Dublin tive a oportunidade de trabalhar com adolescentes (de 11 aos 17) espanhóis, franceses, italianos, alemães e russos por apenas dois meses. Logo, já dá pra ver que tenho um "conhecimento" muito maior do perfil do aluno brasileiro do que o de alunos de diferentes países na Europa. Mesmo assim, não quero perder a oportunidade de registrar uma comparação entre eles já que comparações foram inevitáveis pra mim.


Adolescentes por adolescentes


Pude finalmente concluir que adolescentes são adolescentes em qualquer lugar do mundo (ou pelo menos no mundo ocidental). Eles podem ser "rebeldes", desrespeitosos, desinteressados e em alguns (poucos) casos, jovens actually interessados em aprender e em compartilhar. Trabalhar com essa faixa-etária não é pra qualquer um e demanda muita firmeza, calma e um pouco de "foda-se", já que você vai ter que fingir que não está vendo e ouvindo certas coisas.

O comportamento do adolescente brasileiro com o do europeu me pareceu bastante similar, com duas grandes diferenças: desse lado do oceano, quando eles queriam participar da aula ou falar alguma coisa, SEMPRE levantavam a mão. Não me lembro dos meus alunos no Brasil levantando a mão pra ter permissão pra falar sempre. Fora isso, por aqui eu não era "teacher" e sim "Bárbara" (em diferentes sotaques - os espanhóis e italianos pronunciando meu nome praticamente como eu mesma o pronuncio em português e os franceses carregando muito no R) ou "miss". No Brasil a gente tem esse hábito de chamar o professor de inglês de "teacher", assunto que foi até abordado num workshop na escola Summit recentemente (uma amiga foi e me contou tudo!), o que praticamente não existe em outros lugares. Não vou mentir: dos mais de, sei lá, 50 alunos que tive nesse verão irlandês, apenas uns 2 me chamaram de "teacher" e não pelo meu nome.

De todo modo, não estamos aqui pra falar de comportamento de adolescentes, né? Ninguém merece.



Mas e o inglês?



Vou dizer que senti um certo orgulho e pena dos meus alunos brasileiros.

Orgulho porque, pelo menos se comparar alunos de A1 (ou seja, o cara que tá começando a aprender inglês agora), o brasileiro dá de mil a zero. Só que o brasileiro não tem uma coisa que me pareceu muito forte no europeu: segurança. Aluno brasileiro é inseguro pra cacete, se acha sempre pior do que realmente é, sempre acha que não está aprendendo, que sua pronúncia não é boa, etc, etc, etc. E cara, a pronúncia dos meus alunos brasileiros é infinitamente melhor do que a dos alunos que tive por aqui. Quer dizer, de todas as nacionalidades com as quais trabalhei, os russos e alemães me pareceram chegar mais próximo de um nível muito bom de pronúncia inteligível e neutra. Na sequência vem os italianos e espanhóis e por fim os franceses. O que eu quero dizer é que o aluno brasileiro tem uma pronúncia tão boa quanto à dos russos ou alemães, sabe? Ou até mesmo melhor. Isso porque nem estou falando de sotaque - porque sim, todo mundo tem sotaque, mas parece que os europeus não fazem questão nenhuma de neutralizar o seu pra falar inglês.

hahaha, tenso!

Aliás, já li vários artigos que falam sobre essa questão: o aluno brasileiro quer soar o mais próximo do nativo falante de inglês, faz esforço pra não soar brasileiro, sabe? Morando aqui na Irlanda (e não só como professora), pude notar que pessoas de outras nacionalidades não ligam muito pra isso não - o cara praticamente fala francês com vocabulário da língua inglesa! Tipo, às vezes mal dá pra entender.

Então eu diria que em termos de soar claro e neutro, o brasileiro ganha de todo mundo. Parabéns aos meus alunos! <3


O sotaque


E já que comecei a falar de sotaque, acho legal comentar algumas diferenças que notei: por exemplo, o brasileiro sempre adiciona um "i" no final de algumas palavras e corta o "y" de outras. É comum você ouvir alunos (até mesmo em níveis mais avançados) falando "booki", "cooki" e "stud" (ao invés de "study").

Já os espanhóis pronunciam o "v" como um "b" e transferem essa característica pro inglês também: o resultado é ouvi-los falando "bacations" ao invés de "vacations". O som do R também acaba sendo um problema, já que em espanhol o R [ř] é rolado e em inglês [r] não (clique nos links pra ouvir exemplos). Aí os alunos espanhóis acabam rolando os R, o que em tese não poderia acontecer.

E falando em R, esse pra mim é o graaaande problema dos franceses. Me parecia que eles não faziam questão nenhuma de aproximar a pronúncia do R deles [ʁ] da mais correta em inglês e saíam pronunciando tudo nesse estilo aqui.

Sad, but true.

Os italianos particularmente faziam jus à todas as imitações de gente falando italiano e colocavam vogais no final de todas as palavras (sim, em italiano todas as palavras terminam em vogal). Portanto "school" virava "schoola" e "work" virava "worka".


Produção gramatical


É possível identificar várias interferências da língua mãe quando você ensina uma segunda língua, o que é um processo natural e totalmente aceitável. Aluno brasileiro tem dificuldade pra entender os auxiliares pra pergunta (do, did, will, etc) e acabam construindo frases do tipo "I live here for 2 years", uma tradução direta do português que, embora usada de maneira coloquial, é incorreta gramaticalmente em inglês.

Por eu ter estudado espanhol e italiano (não que eu saiba falar muito, vale dizer) e ter feito um Básico 1 de alemão, deu pra notar padrões similares com os alunos por aqui: os espanhóis falavam "I like play football" sem a preposição to entre os verbos (em espanhol não há preposição entre o verbo gostar + o verbo seguinte: me gusta jugar al fútbol).

Os alemães, por outro lado, às vezes colocavam os verbos no final da frase assim como eles fazem quando estão falando de presente perfeito em alemão. Então "Ich habe diesen Film gesehen" ("I have seen this movie") virava algo como "I have this movie seen".

Na escola de maneira geral os alunos de níveis mais avançados eram alemães, russos e italianos. Já as salas de níveis mais básicos estavam lotadas de franceses. Não sei se era uma particularidade da escola, mas pude notar que mesmo entre os alunos elementares, os espanhóis e italianos tinham um nível de produção superior ao dos franceses.


Qual você prefere?


Não tenho dúvidas de que ter tido essa experiência foi extremamente enriquecedora pra Bárbara pessoa e pra Bárbara professora. Trabalhar numa escola na Irlanda com um público tão multicultural (porque no staff havia professores de outros lugares e tanto a diretora quanto sua assistente não eram falantes nativas de inglês) me mostrou a vantagem de estar numa cidade como essa que abriga tanta gente de tantos lugares diferentes no mundo - e eu adoro conhecer e aprender sobre outros lugares no mundo! No entanto, não vou mentir que senti muita, mas muita saudades dos meus alunos brasileiros - e não porque eu poderia recorrer ao português quando precisasse (o que é verdade, confesso), mas porque não há nada como lidar com pessoas que possuem o mesmo background cultural e histórico que você. A gente se reconhece, se identifica, se vê um no outro.
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